Peso Real na obra de arte

DUDUKA MONTEIRO
3 min readJun 27, 2019
Tarsila do Amaral, 1886–1973

O valor de uma obra de arte pode ser medido pelo tempo de trabalho do artista ou pela fama do autor? Em tempos globalizados midiáticos de escândalos a fama do autor ganha disparado. Estamos a menos de três anos do centenário da Semana da Arte Moderna no Brasil e o universo da cultura nacional ganhará teses dinâmicas.

Em 1922 um grupo de caras pálidas de uma ‘pauliceia antropofágica’, liderados por Mário e Oswald, herdeiros do mulato Machado e do negro Lima, raízes do nacionalismo, transformaram todo o sentido do mundo das artes no país. Até chegarmos ao pós-nacionalismo de Pignatari muita água rolou. E continua rolando, pois esse tema volta sempre à tona.

A primeira metade do século fermentou a cultura. A primeira guerra mundial, a revolução russa, a segunda guerra, a China maoista, os conflitos árabes e a expansão norte-americana nas comunicações eclodiram em fonte de inspiração para artistas e intelectuais do mundo inteiro. No Brasil, distante, oligarquias se revezavam no poder e a Coluna Prestes se tornou a manifestação mais expressiva daqueles tempos retratada por artistas brasileiros. Fechamos o ciclo com o trabalhismo de Getúlio. Mas existiam dois lados e um muro. Os artistas tiveram suas escolhas. Surrealismo e o cubismo foram às marcas do mundo das Artes.

Na segunda metade, criado o Estado de Israel e a contradição palestina, a industrialização e o pós-Cuba suscitaram embates na América Latina. Artistas se manifestaram. No Brasil, como símbolo da década de 60, revigorada pelo surgimento do construtivismo e da Art Pop, os parangolés de Oiticica estimularam Caetano e seu grupo a juntar o violão da bossa nova, com a guitarra dos Beatles e o berimbau. O Tropicalismo, como movimento, ultrapassava as fronteiras do radicalismo. Enfim, o muro ruiu, e talvez a obra mais preciosa do final do século era possuir um pedaço do tijolo que dividia Berlim.

É na dialética e na contradição infinita que criamos. E neste ponto escrevo sobre o XX Salão de Belas Artes realizado pelo Núcleo de Arte do Litoral Paulista — NACLIP, e presidido pela poetisa e artista plástica, Neusa Borges.

Uma “Exposição Coletiva com temas livres em Obras com formas e cores agradáveis aos olhares”, como diz o convite. Com artistas da Região e Capital.

Uma obra de arte nos leva à contemplação ou causa outra reação. Mensagens religiosas, miscigenação e fome estão presentes. A tartaruga marinha também. Um quadro suscitou comentários que a mulher reproduzida na tela lembrava Marielle, assim como a odalisca segurando a espada com as duas mãos fez lembrar-me da personagem de Nelida Piñon que não queria “a faca da justiça em sua mão esquerda”. A obra exposta está ao lado de uma bandeira do Brasil.

Durante a entrega dos certificados, ouvi no discurso de Neusa, que pedia a união em torno do NACLIP, o seguinte comentário: “Antes de ser poeta sou artista plástica”, definiu.

Lembro-me do meu tempo de estudante em que um professor de comunicação disse: “Uma imagem vale mais que mil palavras, mas diga isso em imagem”.

Como sou contemporâneo a respeito da moeda única para o MERCOSUL, “Peso Real” — lançada por nosso presidente, Jair Bolsonaro, em visita a Argentina, fosse eu artista minimalista saberia qual pintaria em um quadro para ser exposto em um Salão em Brasília: um pão!

Valeu a pena visitar o XX Salão.

CLOVIS DUDUKA MONTEIRO

Ator, Jornalista, Publicitário e Radialista.

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Abapuru (ou Nota-Pé): A cruz no mundo das artes. Escrevi este artigo em 09 de junho de 2019. Foram 3.200 toques na crítica acima, tabulada para ser publicada na coluna de algum jornal. Bem, como não consegui publicar, publico em meu blog. É válido comparar obras coletivas? A farinha de trigo para panificação que importamos dos ‘hermanos’ poderá responder a essa simples questão? Como disse Almodôvar, em uma película: “ La arte és a única certeza de salud”.

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